E eu sei que vou chover no molhado, mas vou tentar não chover num mar pelo menos. Eu não sou uma pessoa irritável, sabe, não mesmo, eu sou bem tranquilo, já cheguei a ouvir desaforo de imbecil pra não ter que sair no braço. Sabe como é, eu ainda acho que a violência é a pior ignorância de todas. Mas enfim, sabe uma coisa que me irrita profundamente? Esse negócio de falar "eu te amo". Me irrita muito, muito mesmo. Eu não vou entrar no mérito de ser uma palavra forte e sagrada e coisa e tal, acabaria realmente chovendo no molhado. Eu vou entrar em outro (des)mérito.
Um amigo meu me disse que tem medo de amar. E eu disse, hm, e por quê?, e ele me respondeu que tem medo que vá se entregar pruma pessoa que realmente não ame ele. Que hoje as pessoas burras dizem eu te amo sempre, mesmo não sentindo, e não é como se fosse de má-fé, elas só acham que estão amando mesmo. Ele tem medo de que vá entregar-se num relacionamento e, na primeira adversidade, a pessoa deixe ele, pois na verdade não o está amando, e por isso, leva o relacionamento como se estivesse. Sabe-se a diferença entre um relacionamento pautado entre o amor e o pautado entre a paixão. O levado no amor é como o Japão: resiste a grandes fenômenos destruidores, suporta ações e transgressões mais fortes. O relacionamento levado na paixão é como alguma favela do RJ: qualquer tempestade causa uma deslizamento mortal. E agora eu entro no que eu fiquei pensando depois disso.
Acho que, hoje, as pessoas sentem-se na obrigação de amar. Mais, elas sentem-se na obrigação de falar em voz alta isso, e, quando elas não amam, sentem-se mal e falam mesmo assim, numa tentativa de enganar a si mesmo, para buscar uma melhora na autoestima. Os jovens de hoje (de hoje mesmo, eu olho pro lado e vejo isso) são muito, muito inseguros. Os pais não colocam limites, mimam-nos demais, o que acarreta na baixa autoestima dos filhos. Porque é assim que funciona, se a criança não tem limites, ela sente como se estivesse num campo gigantesco, sem limites. E ela está ali, sozinha. Sem ninguém. Sem poder ver onde está a fronteira desse campo. Se eu estivesse num campo assim, bem, eu tenho certeza que ficaria nervoso. A criança também fica assim, mas traduz isso na baixa autoestima, pois interpreta como se os pais não se preocupassem o bastante com ela para mostrá-la onde está a cerca desse campo, e, por não se sentir importante, a criança desvaloriza-se e menospreza-se diante dos outros. Essa falta de limites - e de fronteiras- cresce junto com a criança e permanece com o adolescente, até que ele se dê conta e modifique o seu inconsciente voluntariamente. O problema é que a maioria dos adolescentes não faz isso. Não se dá conta e não faz a menor questão de dar-se conta, pois não vê a importância disso, mesmo que venha alguém e fale (vamos deixar de lado toda a parte da filosofia do experimentar, que, aliás, nem lembro o nome -quem souber diz aí, é um de um filósofo famoso-). Por exemplo, a maioria das pessoas que ler isso aqui vai achar uma merda e vai mudar de site, assim como a maioria das pessoas nunca lê os editoriais dos jornais ou ri do vídeo daquela guria da Malhação que teve uma epifania e conseguiu suportar, ao contrário da Macabéa em A Hora da Estrela, da Clarice Lispector.
Chega-se, assim ao início, o fato de falar-se "eu te amo" descontrolodamente. Sinceramente, quem não gosta de ouvir um "eu te amo" de alguém que você sabe que nutre algo grande por você? É muito bom, é uma sensação que te preenche. Pois bem, muitas pessoas querem causar essa sensação em outras pessoas para, inconscientemente, sentir a gratidão do dito objeto de afeição, para que este agradeça-o, e, por conseguinte, engrandeça-o, satisfazendo seu ego. Aqui chega o ápice do meu raciocínio: as pessoas dizem eu te amo na esperança de fazer o outro sentir-se bem e na esperança da recíproca. Como muitos pais não colocoram limites, seja por negligência, liberalismo pós-ditadura militar ou incompatibilidade com as inconstantes mudanças da nossa sociedade, os filhos sentiram um "menos amor", se é possível de dizer. Compensa-se, então, nos relacionamentos, com o recorrido uso do "eu te amo". É a busca do equilíbro que motiva tudo, pois um diz que o outro é muito importante e vice-e-versa. Por isso vemos pessoas dizendo "eu te amo" no primeiro dia do namoro (!), ou coisas como "você é tudo que eu tenho na vida", e "nós dois, para sempre ♥". Mas não se pode culpar os pais, obviamente. A culpa é dos próprios adolescentes que não buscaram romper a alienação própria, que impede o auto-conhecimento, que, por sua vez, leva a uma sadia autoestima. Quem se conhece não tem baixa autoestima, pois sabe de seus defeitos e qualidades, sabe que uma rejeição não muda a própria personalidade e o valor que se tem.
Claro que, na contramão, chega-se ao outro extremo, pessoas que repelem qualquer sentimento próximo ao amor, numa prepotência exagerada que tenta passar a ideia de que se é bom demais para esses sentimentos mortais. Quantas pessoas que você conhece que não estão em comunidades como "Narcolepsia Social" ou "Frios e Calculistas", tudo isso uma pseudointelectualidade que só mostra outra dose de baixa autoestima. Mas isso já é assunto para outro post.
De qualquer jeito, o "eu te amo" é algo lindo de se ouvir. Ao menos a ideia era essa.