terça-feira, 14 de janeiro de 2014

talvez haja em algum lugar uma vida tranquila

Oh senhor deste reino,
Deixa-me com meus afazeres cruéis
E se puderes dar-me boas-vindas, ainda hoje,
Hei de ficar muito contente...
Deixa-me com minhas profecias
Com meus tambores e jarras de sangria
Manda-me cartas de um destino qualquer
O meu sangue ora pertence ao mundo
Ora o mundo é que me sangra
E daqui a cem anos depois dessa corrida
Uma incrível criança fará previsões do passado
E a ela será dado
O poder da fala
A ponte entre o céu e o inferno
E a maldição de uma fogueira.

domingo, 12 de janeiro de 2014

dúplica


duas, evidente que eram duas,
a mais leve com a personalidade forte
a pesada, complacente,
uma colada à outra, mas nem por isso
não conflituantes,
as duas cabeças marcadas pelo destino
de trilharem o mesmo caminho.

os cabelos nenhuma tinha,
o que tornava difícil aos outros de diferenciá-las
não fosse a cicatriz da malvada
fincada abaixo do queixo. 

duas, evidente que eram duas, 
soa até artificial não o saber!
como crer que apenas uma
encoberta pela capa de sombras
fosse capaz de tanta maldade
duas cabeças: mas uma ensina à outra
tudo o que é filosofia...

e na mais absurda alegoria,
parece perfeitamente compreensível agora
que na hora do penhasco tenha sido
a cabeça pesada a ter soltado
o único gemido...

duas, evidente que eram duas:
uma com o poder da fala
a outra com o poder do grito.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

a grama do vizinho

a grama do vizinho é mais bonita porque de onde a gente olha, é impossível ver as falhas do terreno, os lugares onde pisaram e a grama morreu, os montes de terra, o cocô do cachorro. como o mundo é injusto comigo! a vitimização é sempre o caminho mais fácil, na medida em que nos tornamos passivos em relação ao ambiente e as causas fogem do nosso controle. no entanto, também é uma situação perigosa, visto que tiramos de nós mesmos o protagonismo de nossa história. e qual o prazer de relegar aos outros a escritura de nosso livro?

em Kafka on the Shore, de Haruki Murakami, há um trecho genial sobre a forma como encaramos a vida. "My grandpa used to say things never work out like you think they will, but that's what makes life interesting, and that makes sense. If the Chunichi Dragons won every single game, who'd ever watch baseball?". qual seria a graça de viver se tudo fosse sempre como planejado? difícil de pensar isso quando estamos sofrendo em determinado momento. entretanto, a médio e longo prazo, a construção de nossas memórias formam uma complicada rede de experiências que, em grande medida, valorizam-se em virtude dos obstáculos pelos quais passamos. ser mártir de vez em quando faz bem, porque nos ajuda a valorizar os momentos em que somos apenas humanos normais.

mês que vem faço 21 anos e me torno legalmente independente. pouca coisa vai mudar. passarei por uma crise? ou meus dramas diários me pouparão do sofrimento?

momentos de tautologia.