São 23:47, da mesma forma como ontem e anteontem, e assim como também será amanhã. O relógio, apesar de influente, é limitado, porque se move sem sair do lugar. De ontem para hoje nós mudamos tanto: as unhas ficaram mais compridas, o cabelo cresceu alguns milímetros. Mas os ponteiros não percebem, pensam que tudo segue igual. Não se dão conta de que as cortinas da janelas esvoaçaram, que o par de tênis sujou de lama e que o almoço de hoje foi mais farto, porque era domingo.
Como se levassem alguma pilha, algumas pessoas vivem como relógios. Podem se mover sem sair do lugar e passar anos com a mesmíssima rotina, as lembranças do passado formando uma simplifcada teia. Ao olhar para trás, tudo é meio parecido. Estamos diante de um dilema complicado, este de entender o funcionamento dos relógios.
Se pensarmos bem, pessoa é coisa de outra mundo. Varia que nem chuva de verão, e o sentimento é rio que lava o corpo todo. Hoje acordei sujo, mas tomei banho quente e chá de camomila e agora estou limpo como se o rio Amazonas corresse por todas as minhas veias, como se houvesse centenas de canoas levando esperança para os ribeirinhos. Amanhã vai ser dia melhor, eu espero, e espero com todas as forças, como se minha vida dependesse disso, como se fosse meu ovo de Páscoa preferido, que o coelho vai trazer.
Hoje à noite, eu tenho de novo cinco anos, durmo com uma orelha em pé e fico atento ao menor ruído daquele que vai trazer alegria no cesto mais bonito. Em Porto Alegre foi o ultimo dia do Carnaval, meus amigos beberam e saltaram na calçada. Eu ajo diferente, em casa faço planos e desejos e espero que deles brotem flores para decorar um sonho bom.
São 00:22, da mesma forma como ontem e anteontem, e assim como também será amanhã. Mas um universo se expande dentro da gente, e nasce uma energia que não tem causa ou consequência, como uma fome de mundo.
2 comentários:
...como uma fome de mundo.
Muito profundo teu pensar
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