quem diria que o cordão do sapato
que tantas vezes usei para prender
meus pés ao chão
um dia seria utilizado
para me fazer tombar
e o ar comprimido no espaço de tempo
entre a queda
e o solo
seria seco como um tiro
e todos os meus defeitos soassem muito terríveis
e toda a minha vida passando num segundo
me desculpem aqueles que feri
obrigado àqueles com que ri
os que um dia amei, imploro,
jamais esqueçam do carinho que nutri
cada vez mais chego perto do asfalto
tudo parece tão claro e efêmero
tão diminuto
engraçado como em menos de um segundo
o que é muito vira pouco e o que é pouco, mais ainda
ao mesmo tempo em que se percebe, ora
chegou a hora de enfiar a linha na agulha
e costurar todos os remendos e falhas
fendas por onde o vento passa.
sábado, 31 de março de 2012
domingo, 25 de março de 2012
Círculo
Dançávamos Kids do MGMT em meio a todas aquelas pessoas que em frívolo julgamento aparentavam ser todas iguais, uma forma maniqueísta de ver caso tomemos a semelhança de suas roupas descoladamente alternativas e os cabelos levemente arrepiados enquanto dançavam, cantavam, estendendo as mãos para cima ao iniciar uma música nova enquanto as luzes chacoalhavam em um frenesi aquático. Nós também chacoalhávamos, não tanto em frenesi porém mais em uma sedução, visto que há uma diferença na dança da sedução do que naquela de apreciação dos sons. Quando se seduz, a cabeça move-se mais lentamente como se uma câmera cinematográfica desse close nos menores detalhes do pescoço, além de geralmente também se olhar para cima como se se invocasse alguma força misteriosa de dentro, talvez algo assim profundo..., a ponto de mexermo-nos lentamente como se não milimetricamente planejássemos cada passo, olhar, toque, palavra no ouvido que, mais do que nunca, sabemos que é dita qualquer bobagem sem o menor sentido senão o de colocarmos a boca no ouvido à espera de que o jogo da luxúria frua como a música que custa a sair do corpo, uma energia flutuante que faz os pés queimarem precisando sair do chão. Duas palavras, contudo, quebraram meu estado de automaticidade. Qualquer coisa como:
- Envelheça comigo - uma mão no meu ombro e outro no meu braço do lado oposto. Pedi que repetisse, não sei se pelo enunciado soar fora de contexto ou se pela vontade de que colocasse a boca perto do pescoço novamente, sei que pedi e ouvi de novo as mesmas palavras. Estranhei. Tive um pouco de receio. Entretanto, controlei o temor e fui extrair o que podia, indaguei: "e como será tua velhice?". Rodeada de pessoas gentis, respondeu, talvez vivendo em uma casa com alguém que amasse, usufruindo daquilo que obtive na vida e nas tentativas de dar a volta em mim mesmo. Foi uma resposta boa, pensei na hora, tomando como inusitado aquele diálogo em meio às mesmices de sempre - pessoas cantando, dançando em uma guerra de egos e se encarando como cadelas no cio loucas para. Amargura um pouco ver recortes dos passos de lobos encarando seus carneiros que almejam com todas as forças se tornarem lobos por mais que nunca o possam, visto que, uma vez carneiro, sempre carneiro, a vivência de lobo é de algo deveras escura e misteriosa, não a ponto de instigar a descobrir, mas sobretudo naquele sentimento que nos move pela fuga.
Moveu-se pela pista e voltou com uma bebida - o álcool que degrada, instalando-nos mais perto daquilo que chamam de época branca cujo principal hábito será reclamar das músicas altas e sem qualidade dos jovens de hoje, jovens que não fazem nada além de frequentar os mesmos locais, ouvir as mesmas músicas e viver as mesmas sensações, acreditando saber da novidade. Bebeu um gole e perguntou-me outra vez, envelhece comigo? E respondi rápido que nem sei se quero amanhecer com você, quem dirá envelhecer
quem dirá saber de minha vida de depois
como um baú cheio de roupas
onde as traças adoram se meter
estragando as roupas de amanhã
e eu sem saber o quer que faça
formando buracos, armando barracos
costurando retalhos com linhas de aquarela
e posando para fotos amarelas
que
tempos depois
vão descansar ao sabor do vento
enquanto eu, na minha vitória
já terei me recolhido há muito tempo...
Habitou-me e eu em seu contrário. No meio da madrugada fui-me embora, pensando em que na semana que vem o mesmo lugar teria uma festa boa, e no outro final de semana também. Aliás, todo o mês estava perfeito naquele lugar, os donos detêm uma boa visão de negócio...
*
Vários anos se passaram. Nunca mais apreendi qualquer coisa que me fizesse recordar dessa noite, até o dia em que, com meu Amor Maior, trocamos juras de eternidade e prometemos morrer ligados um ao outro, sem nos importarmos com eventuais quedas de cabelo. No fundo, verdadeiramente acreditei no que falava. Contudo, havia um juízo maléfico a me dizer da existência de uma improbabilidade na fruição da promessa. A vida é uma sequência de ilusões, refleti.
- Envelheça comigo - uma mão no meu ombro e outro no meu braço do lado oposto. Pedi que repetisse, não sei se pelo enunciado soar fora de contexto ou se pela vontade de que colocasse a boca perto do pescoço novamente, sei que pedi e ouvi de novo as mesmas palavras. Estranhei. Tive um pouco de receio. Entretanto, controlei o temor e fui extrair o que podia, indaguei: "e como será tua velhice?". Rodeada de pessoas gentis, respondeu, talvez vivendo em uma casa com alguém que amasse, usufruindo daquilo que obtive na vida e nas tentativas de dar a volta em mim mesmo. Foi uma resposta boa, pensei na hora, tomando como inusitado aquele diálogo em meio às mesmices de sempre - pessoas cantando, dançando em uma guerra de egos e se encarando como cadelas no cio loucas para. Amargura um pouco ver recortes dos passos de lobos encarando seus carneiros que almejam com todas as forças se tornarem lobos por mais que nunca o possam, visto que, uma vez carneiro, sempre carneiro, a vivência de lobo é de algo deveras escura e misteriosa, não a ponto de instigar a descobrir, mas sobretudo naquele sentimento que nos move pela fuga.
Moveu-se pela pista e voltou com uma bebida - o álcool que degrada, instalando-nos mais perto daquilo que chamam de época branca cujo principal hábito será reclamar das músicas altas e sem qualidade dos jovens de hoje, jovens que não fazem nada além de frequentar os mesmos locais, ouvir as mesmas músicas e viver as mesmas sensações, acreditando saber da novidade. Bebeu um gole e perguntou-me outra vez, envelhece comigo? E respondi rápido que nem sei se quero amanhecer com você, quem dirá envelhecer
quem dirá saber de minha vida de depois
como um baú cheio de roupas
onde as traças adoram se meter
estragando as roupas de amanhã
e eu sem saber o quer que faça
formando buracos, armando barracos
costurando retalhos com linhas de aquarela
e posando para fotos amarelas
que
tempos depois
vão descansar ao sabor do vento
enquanto eu, na minha vitória
já terei me recolhido há muito tempo...
Habitou-me e eu em seu contrário. No meio da madrugada fui-me embora, pensando em que na semana que vem o mesmo lugar teria uma festa boa, e no outro final de semana também. Aliás, todo o mês estava perfeito naquele lugar, os donos detêm uma boa visão de negócio...
*
Vários anos se passaram. Nunca mais apreendi qualquer coisa que me fizesse recordar dessa noite, até o dia em que, com meu Amor Maior, trocamos juras de eternidade e prometemos morrer ligados um ao outro, sem nos importarmos com eventuais quedas de cabelo. No fundo, verdadeiramente acreditei no que falava. Contudo, havia um juízo maléfico a me dizer da existência de uma improbabilidade na fruição da promessa. A vida é uma sequência de ilusões, refleti.
22 de junho de 2011.
Tema: velhice
Para o Clube da Escrita
sexta-feira, 23 de março de 2012
mediações
ou reflexões sobre a dualidade do ser.
um quadro na parede
acostumou as vistas da família
as cores que num dia chamavam
no outro se tornaram desgastadas
de tanta indiferença ele mudou
da moldura o quadro vazou
o lago que havia parado
de calado virou cachoeira
escaldou no piso da sala
uma pintura revoltada
que de tanta mesmice enfureceu
e de tanto derreter
respingou
e de repente encaro um jovem magro de olhos claros
com olhar tão curioso
e tão pesado
que me olha como quem indaga
me intimida e me aproxima
me toca como homem algum jamais tocou
no plexo daquilo do abstrato
o que é fato e o que não é
não saberei
apesar de calado
o jovem se cansa
vai embora
e enfim eu me aquieto logo agora
afora uma pintura congelada.
um quadro na parede
acostumou as vistas da família
as cores que num dia chamavam
no outro se tornaram desgastadas
de tanta indiferença ele mudou
da moldura o quadro vazou
o lago que havia parado
de calado virou cachoeira
escaldou no piso da sala
uma pintura revoltada
que de tanta mesmice enfureceu
e de tanto derreter
respingou
e de repente encaro um jovem magro de olhos claros
com olhar tão curioso
e tão pesado
que me olha como quem indaga
me intimida e me aproxima
me toca como homem algum jamais tocou
no plexo daquilo do abstrato
o que é fato e o que não é
não saberei
apesar de calado
o jovem se cansa
vai embora
e enfim eu me aquieto logo agora
afora uma pintura congelada.
quarta-feira, 21 de março de 2012
bonecos
então a vida se resume a projeções mal feitas. seres andando de olhos fechados crendo estar na calçada tomando unicamente como base as visões da imaginação. mas por que isso, sabe? por que esta necessidade de sair do corpo e utilizar o outro como objeto a dar forma a expectativas, sonhos e frustrações em uma massa corpórea de vida própria que insiste em não obedecer aos nossos comandos. posto isso, falo na esperança de ver o outro reagindo às minhas palavras enquanto me sinto de alguma forma mais calmo por ver que enfim alguém percebe minha existência patética e efêmera. ridículo ridículo, o diálogo prossegue visto que o outro ouve tudo com atenção somente para que possa enfim falar e discorrer sobre seus dramas existenciais em uma verborragia dramática.
raiva desse egocentrismo que nos acolhe em uma interação com objetivos claros de utilizar o interlocutor como minha plateia - bajulando-me, adorando-me e acariciando meu ego que é frágil por motivos escusos que me recuso a encarar ou domar. dificilmente um elogio dado sem o peso de um bumerangue que voa por um campo para voltar ao mesmo lugar de onde saiu.
quem sabe sejamos sinceros? eu digo que quero isso e isso de você, você responde que deseja de mim todos os pores-do-sol que existem para que enfim eu admita que de ti espero nada menos do que uma felicidade arrebatadora e dilacerante e que por favor não me uses como se eu fosse um simples boneco transtornado, se escrevo sem vírgulas e maiúsculas é porque o pensamento não os tem, você já viu um pensamento pontuado? não nunca viu porque essas letras visuais apenas tentam prender em alguns símbolos as lembranças de sensações abstratas que infestam minha cabeça como aquelas abelhas dos desenhos animados perseguem animais caracterizados com sentimentos humanos feitos para criarmos empatia.
sensação esquizofrênica de que todos querem nos manipular. e não me refiro à publicidade ou aos jornais, mas sobretudo às pessoas com suas vulnerabilidades psicológicas que constato na minha visão ansiosa e incapaz de arranjar uma solução. por consequência, me porto com aquele olhar de assombramento que me faz distanciar de situações, mas, ao mesmo tempo, não me ajuda a lidar com fatos e atos de deslizes, se ainda me pego tentando manipular os outros da mesma forma como noto os outros tentando me usar...
faz falta entender de teatro. ou de gente.
raiva desse egocentrismo que nos acolhe em uma interação com objetivos claros de utilizar o interlocutor como minha plateia - bajulando-me, adorando-me e acariciando meu ego que é frágil por motivos escusos que me recuso a encarar ou domar. dificilmente um elogio dado sem o peso de um bumerangue que voa por um campo para voltar ao mesmo lugar de onde saiu.
quem sabe sejamos sinceros? eu digo que quero isso e isso de você, você responde que deseja de mim todos os pores-do-sol que existem para que enfim eu admita que de ti espero nada menos do que uma felicidade arrebatadora e dilacerante e que por favor não me uses como se eu fosse um simples boneco transtornado, se escrevo sem vírgulas e maiúsculas é porque o pensamento não os tem, você já viu um pensamento pontuado? não nunca viu porque essas letras visuais apenas tentam prender em alguns símbolos as lembranças de sensações abstratas que infestam minha cabeça como aquelas abelhas dos desenhos animados perseguem animais caracterizados com sentimentos humanos feitos para criarmos empatia.
sensação esquizofrênica de que todos querem nos manipular. e não me refiro à publicidade ou aos jornais, mas sobretudo às pessoas com suas vulnerabilidades psicológicas que constato na minha visão ansiosa e incapaz de arranjar uma solução. por consequência, me porto com aquele olhar de assombramento que me faz distanciar de situações, mas, ao mesmo tempo, não me ajuda a lidar com fatos e atos de deslizes, se ainda me pego tentando manipular os outros da mesma forma como noto os outros tentando me usar...
faz falta entender de teatro. ou de gente.
sexta-feira, 16 de março de 2012
Considerações (4)
assim como o fogo é vida
a vida é fogo e de tão linda
arde a mão daquele que lida
mas de tão calor este tal jogo
é um círculo que gira
e gira como pode
queima sem saber que me fode
a vida é fogo e de tão linda
arde a mão daquele que lida
mas de tão calor este tal jogo
é um círculo que gira
e gira como pode
queima sem saber que me fode
sinal
tudo é prova de deus quando queremos.
sinal de felicidade e de amor
e dor e impulso para frente.
todas as coisas assinalam outras coisas que não outras
aquelas que queremos.
isso não é poema
é descrença.
se tudo é sinal, todas as horas marcam uma doença.
mas não temos relógio para tanta marcação.
não temos ponteiros.
não temos tanto tempo.
(pressa de viver
e ser)
sinal de felicidade e de amor
e dor e impulso para frente.
todas as coisas assinalam outras coisas que não outras
aquelas que queremos.
isso não é poema
é descrença.
se tudo é sinal, todas as horas marcam uma doença.
mas não temos relógio para tanta marcação.
não temos ponteiros.
não temos tanto tempo.
(pressa de viver
e ser)
quarta-feira, 7 de março de 2012
força
hoje fui tomado por uma espécie de euforia
uma alegria como se por dentro
um furacão crescesse com energia
daquela vontade de recusar o não
e abri os braços a uma nova fase
mais uma vez as represas se rompendo
estado de calamidade
dispersão.
sexta-feira, 2 de março de 2012
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