terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Mala de quatro estações

Para quem não sabe, há uma expressão, na língua portuguesa mesmo, que diz vai esconder onde, então? no tempo?, que se utiliza com o interlocutor a fim de dizer que não há lugar para esconder aquilo de que se fala. É nessa expressão que o poeminha a seguir se inspirou.


A partir de agora
Guardarei minhas melancolias no tempo
Mala de verniz e cruel
Escondendo as minhas glórias
E todas as frustrações do depois
Se soubesse de suas funções
Nunca a teria comprado
Venderam-na como quem vende fiado
De jeitinho bravo
E rancoroso
Lá sabia eu
Que o belo presente viria cheio de adornos
E missanguinhas sem brilho e odor
Conteúdo mistíco e amargo
De exterior um pouco gago
Repetindo sempre as mesmas lições
Sem que em uma era eu aprendesse
Me vendo agora, sinto-me especialmente patético
Por dar voltas e voltas
E quedar-me no mesmo lugar...

Eu sempre quis voar
Mas pensando bem
Parece-me deveras exaustivo
Controlar cabeças lá do alto
Sem deter a real certeza
De que caso eu manque
Alguém pode me pegar
E salvar-me de quedas absurdas
Tomando-me eternos segundos
Em que os utilisaria para mostrar minhas mesuras
Meus modos à mesa
Aprendidos há mais de quinze anos
Quando não largava a mamadeira
E o dia parecia não passar.

Eu usava uma mala boa
E nova
Que ao adquirir manchas de uso
Se deteriorou. Como rugas
Fixadas em pele áspera
Agora ela parece querer agonizar
Mas isso não há de me tocar
Já que os decênios andam tão rápido
Que mal posso ligar para mim

Quem dirá para ti, mala de formosura e tempo.

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