quinta-feira, 18 de julho de 2013

Quando uma francesa partiu meu coração

A verdade é que eu sou bissexual, mas por não exercitar, fiquei gay. Garotas sempre me atraíram. Entretanto, na minha inocência, sempre confundi essa atração por aquela afeição que nutrimos por filhotes de cachorro, velhinhos que dançam ou uma gostosa torta de chocolate. Tudo isso pode parecer loucura, mas foi o que me veio à mente naquela aula de historia dos Estados Unidos, quando minha colega francesa ajeitava os cabelos e deixava o pescoço liso à mostra. Como era bonito! Tão delicado que a brisa invernal do outro lado da janela poderia feri-lo. E eu, sentado na fileira de trás como um pré-adolescente em paixão platônica. Ou pior, um vampiro.

Preciso dizer que ela não era uma francesa típica. Na verdade, sua beleza parecia um mash-up que deu certo. Tinha ascendência indiana, o que explicava sua pele cor de oliva e os olhos negros como um poço-d'água. Da França, puxou a maquiagem pesada, o batom vermelho sempre nos lábios, a boina vermelha que volta-e-meia portava e as roupas que pareciam vir diretamente de uma passarela de moda parisiense. Quando o professor lhe perguntava algo, respondia em inglês com um simpático sotaque francês, sem abrir muito a boca para as vogais e sem pronunciar o "h" como "r". Grosso modo, era fantástica de ser observada.

Mas, afinal, porque ela me chamava tanto a atenção? Seria eu um bissexual enrustido!? Como explicar isso aos meus pais!? Apos todo o trabalho em aceitar o filho gay, agora eu teria que traumatizá-los de novo... Minha mãe iria chorar visto que a partir de agora eu teria mais 50% de chance de ter o coração partido e sofrer por amores infrutíferos, meu pai me xingaria porque eu mudo de ideia o tempo todo, meu irmão pegaria no meu pé pois... é meu irmão, e é isso o que irmãos fazem. Por que isso agora? Como uma simples francesa poderia mexer tanto comigo?

A verdade é que ela não era tão simples. De fato, era bastante charmosa na forma como cruzava as pernas, ajeitava o óculos de aro fino e apoiava o queixo nas mãos enquanto refletia sobre a a colonização a oeste do rio Mississípi. Falava com impetuosidade, mas se portava de uma forma frágil como um pacote de Ruffles. Até hoje, creio que transpirava perfume.

Apos semanas de reflexões introspectivas e de desesperadas tentativas de fazer com que me olhasse, decidi falar com ela. Cheguei atrasado de proposito, avistei uma cadeira vaga ao seu lado e sentei-me. Na primeira oportunidade, investi:

- Oi! Você entendeu por que o México estava enfraquecido antes da guerra com os Estados Unidos? Eu não peguei muito bem...

- Você não leu o texto para esta aula? - ela perguntou, de forma incisiva. Fiz que não com a cabeça e sorri. - Então se você não quer estudar, não atrapalhe os outros quando eles querem! - revidou rispidamente, e em seguida se virou em direção ao professor para me ignorar.

Nunca fui o mesmo depois dessa. Meses depois, conversando com uma amiga, cheguei à conclusão de que não sinto nada por garota qualquer. Acontece que algumas são tão belas que a gente acaba apreciando como uma obra de arte - por serem estéticas, profundas e intocáveis. Na busca do belo, ficamos hipnotizados. Fosse com a francesa ou com filhotes de beagle, o sentimento era o mesmo.

De qualquer forma, hoje já sei: entre uma garota e uma torta, prefiro a torta.