domingo, 29 de julho de 2012

dureza

Todo ato é um símbolo
do peso daquilo que me esmaga
                   Psicose 4h48, Sarah Kane

não consigo escrever
com estas cordas que amarram
as mãos junto à boca, o corpo
vai caindo
as pernas primeiro
em seguida os joelhos
na terra, a lágrima
molha o solo seco
e minha cara amarronzada
com a sujeira que enobrece
a inocência da minha face.

não quero tecer
conjecturas
de uma vida de mares de tristeza
onde a leveza foi aos ares
e a dureza faz cantares
de destruição.
como podes ter tudo
e ao mesmo tempo nada?
"parece ter toda a plenitude!"
mas ainda assim 
um vazio que não tem fim

e tão babaca
uma essência espalhada em muitas esquinas
e precisa olhar para cima o tempo todo
como se assim fosse o tempo todo
uma cousa cheia de aforismos
e regras bem delimitadas.

quero dormir
atingir objetivos
perspectivas
depois dormir de novo
e acordar de novo
só para voltar a dormir...

o olho de deus
Deus ao meu lado
diz palavras de afeto
em um teto muito louco
de nuvens e chuvas
um avião caindo
e eu choro compulsivamente
porque minha vida falta muito
tudo me falsa e faz ausência
me exige uma correta postura
reta e ambiciosa
porque tens tudo e por isso podes tudo
e quero tudo 
e nada
dormir

o olho de Deus
ao meu lado
me observa com uma malícia sexual
de quem quer fazer sofrer 

só pelo prazer de observar
o outro perdido
com a pedra no caminho.
mas que terrível loucura!
será que só 
a tapas se aprende?
também me agrada ser feliz!
e chorar de alegria...


a vida

é uma mala cheia de roupas de viagem
mas estamos sempre de passagem
sem saber aonde ir, o que fazer
ser ou desfazer...

segunda-feira, 2 de julho de 2012

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há uma diferença gritante
entre o objeto e a sombra
apesar de ambos marcarem o chão
somente o primeiro sai de si 
se revolta e diz que não
agora quero já outro caminho
e ninguém vai me seguir
tanto faz tanto fez se sol ou chuva
se me ama ou me larga numa curva
e logo diz que o ar é rarefeito
e me diz frases de efeito
compara o céu à terra
a paz à guerra a pomba ao maremoto
e como um homem devoto
põe o terço e faz a cruz em água-benta
veste com cuidado sua jaqueta
embala na moto e diz até mais ver
e eu fico a contemplar algo que assombra
(oh meu deus 
há uma diferença gritante
entre o objeto e a sombra)...