quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

por nove dias odiei o rosto dele, para no décimo perceber que me odiava nos seus atos.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013



"- Please don’t tell anyone this, but I want to be happy.

- Of course you do, everyone does.

- Yeah but I didn’t think that I did. ..I made a promise such a long time ago that I was gonna take in experiences, all of them, so that I could tell other people about them and maybe save them... But it gets so tiring trying to take in all the experiences for everybody, letting anyone say anything to me. And then I came here and I see you... And you got the fruit in the bowl and the fridge with the stuff... And the robe and you’re touching me the way that… I realize I’m not different, you know? I want what everyone wants. I want what they all want. I want all the things. I just wanna be happy."

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Fragmentos, sotaques e revisões


O frio de 8°C derreteu boa parte da neve acumulada em dois dias consecutivos de precipitação. Caminhar pelas ruas já não é mais uma experiência agradável, senão um exercício de cuidado em evitar os montes acinzentados de gelo e sujeira. Em vez de uma paisagem onírica, a cidade desfalece pelo asfalto em direção aos bueiros, como a provar que o tempo tem um prazer em oprimir memórias felizes. Minha amiga, escondida em um grosso casaco marrom de veludo, sente frio e ajeita o cachecol vermelho. Já passa de 1h da manhã. Apesar do sono, ela segue tentando esconder a tristeza que toma seus gestos e falas. O namorado, com uma previsível gentileza, esconde-se em um prédio para mijar a fim de nos deixar sozinhos na despedida. 

Como é isso de se aproximar de uma pessoa a ponto de fazer parte dela e depois ter que se despedir sem a plena certeza de que um dia haverá um reencontro? 

"Erasmus mudou a nossa vida". Sempre gostei do seu leve sotaque alemão. Minha amiga foge de todos os estereótipos que possamos atribuir a pessoas do seu país. Não gosta de cerveja, fala docemente, não é nem um pouco fria e seu maior objetivo é viver de arte e de ensinar alemão e francês. Enquanto esperamos o meu trem em uma cidade cercada por montanhas em todos os lados, fazemos esforços de não dar importância à despedida. "Eu volto para Grenoble na primavera. Senão, a gente pode se ver em Florianópolis". Sorrio, porque sei que quer me confortar. Se o presente é triste, ao menos devemos aceitar o conforto dos planos. 

Ainda não entendo como é possível criar uma ligação tão forte com uma pessoa por intermédio de um idioma que você não domina da mesma forma que o faz com sua língua materna. Creio que, nessas horas, os gestos e expressões faciais adquirem um poder imensurável. E o silêncio na hora certa vale ouro. A mensagem essencial, evidentemente, é sempre repassada. Mas a falta de intimidade com o francês exige que andemos na mesmíssima roda-gigante, na qual lidamos com uma lista de palavras predeterminadas para descrever sentimentos sem dar sempre conta das nuances. E se não sabemos o verbo, explicamos. Se não sabemos explicar, inglesamos. 

"Faz uma semana que não falo ou penso em alemão", disse-me pouco tempo atrás, enquanto esperávamos o sinal vermelho para os carros. Para mim faz uns três, respondo. "Então falemos agora". Por 30 segundos ela conversa em uma língua bruta demais para sua delicadeza. Em seguida, como quem pega pela mão um pássaro que estava voando, falo em português sobre como a neve me deixa simultaneamente feliz e triste. Rimos e atravessamos a rua, embalados pelo conforto de que, em alguma forma, reaproximamo-nos de nossas origens. A falsa certeza de que sabemos de onde viemos. E, com isso, para onde caminhamos. 

Falar em uma língua que não é sua, viver em um pais que não é o seu, acordar todos os dias com uma paisagem que lhe é estranha e estudar assuntos que você nunca tinha refletido sobre acaba por criar um vazio no meio do peito, cuja dor aflige por também ser prazerosa. Somos este vazio que nos toma ou o espaço que nos preenchia antes? Os novos amigos são mais importantes do que nunca, ocupando o lugar da família e dos parceiros de longa data. Ao correr das tardes frias, minha amiga e eu revivemos o passado para conhecer um a história do outro. A intimidade nasce das memórias compartilhadas, em uma ponte que aproxima todos os tempos verbais, um processo que envolve fatos presentes e retrospectivas do que já foi. No nosso caso, ainda a previsão de um futuro - incerto e líquido. 

Bate um vento forte e coloco minhas luvas. Ela abre a bolsa e tira três fotos. Em uma, há uma dedicatória. "Mas lê somente no trem, de acordo?". E em seguida me dá as imagens, apertando minha mão direita assim que toco seus dedos. Começo meu discurso de adeus, sem querer ser cafona, mas já sendo (porque as verdadeiras cartas de amor são sempre ridículas, como dizia Pessoa...). Sou interrompido pelo barulho do trem, que corta todas as expectativas de uma despedida decente, carinhosa e cinematográfica, do jeito que a gente gosta. Nos segundos que nos restam, minha língua fica presa e não tenho sucesso em expressar-me. Scheisse! Désolé, chérie... Ela ri e me diz até breve, também presa pelos muros impostos por esta língua que ora nos liberta, ora nos oprime. Digo obrigado, meu deus, obrigado por tudo, e a abraço. Até breve baixinho e entro no trem. Ela sorri na calçada e abana. 

Irônico o fato de que é minha amiga quem se prepara para partir, mas agora quem vai embora sou eu. A vida, nessa mistura de palavras, encontros e desencontros, nos deixa atordoados e sem tempo de respirar e formular uma frase decente, e de repente você se vê na janela de um trem, lendo a parte de trás de uma foto e revendo os últimos seis meses de vida em milésimos de segundo, e a força do sentimento é tão forte que você chora e volta mais uma vez àquela época de criança desolada, cujo doce foi injustamente tirado antes do fim. A hora certa nunca é a de agora. O relógio da vida está sempre adiantado...

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Assinatura (editada)


Nossa, que canseira!
Pensar me consome muito
Me põe entre a cruz e a espada
E assim deslizo numa escada
Até o fim dos meus degraus...
Erguendo prédios de papel
Neste reino de loucura
Dos sapatos do bom moço
De cachecol no pescoço 
Paletó de gente fina
E perfume bon vivant.

Chegou o Carnaval!

"Vamos colorir os slides?"
Cores? Por que cores? Você quer Carnaval?
Você sente falta do Brasil? Vocês
São muito engraçados!

Somos muitos engraçados
Este reino me elegeu como bobo-da-corte
E agora o chapéu me pesa os ombros
Odeio este tipo de classificação
Se digo"não", é uma pena
Tinha tanto futuro!
E assim revelo todos os furos
Numa roupa bonitinha, mas cafona
E em passos de uma dança clichê
Celebro a matéria das coisas
O sentido que me dão ao nome
E à minha incitada consternação.

Nossa, que fome!
Hora de aceitar todas as rasuras
Me amar com a nova letra
E comprar justas canetas!
Hei de pintar no meu corpo a minha rubrica
Virar a mesa da sorte
E jogar o meu baralho a meu favor...
Vestir a tunica da vida, viver bem
O sofrimento e a nostalgia, 
Para na hora da alegria e da vitoria
Saber criar a historia dos meus atos
Com meu devido nome...

(sem morais nem seus contos
rimas ou inversões)

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Diarios

19/01/2013 No aeroporto de Madrid

Um teto bastante alto, construido para imitar ondas de um mar revolto. Bege, cuja textura lembra uma esteira de praia na qual mulheres despreocupadas se atiram para repousar. E eu sentado, sozinho, com um cansaço nos ombros e uma sede na boca.

Chove em demasiado.

Em Madrid me ponho a associar arquitetura ao mar. Precisaria de um mergulho?

O aeroporto é imponente. Cadeiras de trabalhado plastico, pintado de cinza, somadas às dantescas colunas de metal prateado, produzem um ambiente afogado em uma aura de modernidade. O piso de marmore, limpido. E o ar com cheiro de ferro. Televisões Samsung de 29 polegadas exibem um seriado espanhol de comédia de péssima qualidade. Ao menos a resolução da imagem é quase perfeita. Seu defeito é ser plastica demais. Boa demais.

São 06:47 e não ha almas vivas além de mim e alguns homens a encerar o chão. As unicas vozes vêm da televisão e das minhas palavras no papel. Na tela, uma bela jovem beija um velho gordo em um cemitério. Além do mundo da ficção, quantas pessoas fariam igual? E não se assustariam com a grande barriga como obstaculo... 

Ficcionalizamos na tentativa de ultrapassarmos limites. Penso isso enquanto encaro o horizonte através de uma grande janela de vidro a me separar de aviões e da pista de decolagem. Do mundo exterior. Do frio e da chuva europeia.

Como em uma redoma de vidro, estou a salvo do vento gelado e das preocupações do dia a dia. Nada de atenções ao trabalho, ao sofrimento, à saude, aos problemas dos outros, do mundo, da casa. Nada de aspirações ao futuro, nada de pressões e deveres. Nada de ambições. Precisamente agora, preciso apenas me ater à outra tela mais ao longe, cuja unica função é dar-me outro sentido de vida. Isto é, saber o horario e o portão do meu voo para Lyon. Depois disso, criarei outros sentidos. Retomarei meu nome e voltarei a me apossar de mim mesmo. Mas por enquanto não importa, eu não me pertenço, eu não me controlo. Quem manda é o aeroporto, e eu amorteço.

La fora esta escuro, mas os homens trabalham.