terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Recordos (2)

Por um acaso, encontrei um texto meu escrito no ano passado, após um dia de cão. De alguma forma, achei relacionado ao poeminha do post anterior e decidi publicá-lo, também para que você pense aquilo que pensei. Tirando mudanças para evitar repetições de palavras, segue na íntegra. No começo falo de política. No fim, falo de pessoas. Você pode ler tudo - ou nada. You have options.

"Uma comunidade é constituída por uma gama de indivíduos. Para tornar-se um ser social, é preciso interagir em um grupo, trocando informações, mensagens e sentimentos. Neste processo de inclusão, é preciso ser um indivíduo - ou seja, individualizar-se, visto que a capacidade de ser diferente em relação ao outro é o que assegura nossas fronteiras, no momento em que sei que meu corpo acaba quando vejo que minha pele é distinta do papel que toco agora. A cor branca do bloco não é a mesma cor dos meus dedos, o que me faz concluir que ambos não são a mesma coisa. Resumindo, tenho a necessidade de me assegurar da diferença entre as coisas do mundo para saber aquilo que sou e o que não sou; quais os meus limites e quais as minhas possibilidades que me asseguram de evitar um risco de morte. Isso vale para entender meu corpo, mas também para compreender minha personalidade a fim de manejar meu ego.


Em nossa sociedade, o consumo é praticado como meio de adquirir um signo de diferenciação. Ao obter um produto, agrego a mim o valor embutido. 


O paradoxo é que a busca da esquerda política é a igualdade, por meio de tentativas de incluir o excluído dentro da comunidade. Mas como promover a igualdade se a busca do ser humano é a diferença? Além disso, a cidadania é hoje efetivada pela capacidade de interagir no mercado, tendo em minhas mãos representações concretas de um status econômico que me identifiquem em um meio.


A esquerda inclui uma pessoa em um grupo. Uma vez dentro, o indivíduo tentará o mais rápido possível diferenciar-se dos outros, também na tentativa de impor sua importância e relevância em meio a uma aglomeração que muitas vezes parece uniforme e vazia. Os processos de diferenciação não são benéficos para quem não tem tantas armas de distinção - no caso, pessoas de pouca renda que não podem comprar roupas caras e carros de luxo ou consumir alta cultura. Dentro de uma comunidade, o indivíduo tentará provar seu valor, empurrando os semelhantes para todos os lados (mais provavelmente um degrau abaixo na pirâmide social), a fim de demarcar o território.


O que é viver em sociedade? Uma batalha em que mal sabemos de que lado estamos? Como se fôssemos todos lobos. Carnívoros. Andando em matilhas a fim de demonstrar poder em frente aos mais fracos. Quem é o chefe? Quem obedece o faz por gosto ou por obrigação? Eu, Marcel, me vejo perdido em uma encruzilhada. Não quero obedecer, mas também não quero mandar. Procuro não excluir, mas excluo. Tenho preconceitos, sinto inveja, raiva e ciúme. Tento entender meus sentimentos e posturas de mundo, na expectativa de tentar manejá-los, mas vejo que meu ego muitas vezes é forte o bastante para me impedir de tocá-lo. Quem sou eu neste mundo? O que posso fazer para tentar fazer a diferença. Por que quero fazer a diferença? É uma necessidade de tentar deixar marcas após minha morte? Que se lembrem de mim? Isso também é uma forma de me diferenciar dos outros... O que me faz pensar que volto ao ponto de partida. Anulo-me ou libero-me? 


O que é bondade e maldade? E o amor? Se se diz que, em um relacionamento, um ama mais do que o outro, é porque o outro é incapaz de amar mais? Uma pessoa pode amar mais do que a outra? Tem mais sentimento para prover ou simplesmente não se solta o bastante? Se há pessoas que nunca na vida odeiam alguém, há quem jamais ame? E me refiro aos relacionamentos amorosos, evidentemente, porque amor para pai e mãe é indiscutível. Amar é uma questão de possibilidade ou de oportunidade? 


(Que o tempo me diga.)"

Nenhum comentário: